Temos a tendência de apontar e julgar o que não conhecemos ou entendemos. Tentar compreender aquilo que não faz parte da nossa vivência demanda tempo, vontade e paciência; e nem sempre o outro está aberto à reflexão. Quando comecei a frequentar festas eletrônicas no final de 2017 (que deu margem para uma pesquisa acadêmica em torno do assunto que você pode acessar aqui), a ideia do que era o Trance ainda era nebulosa em minha mente. Não diferente de grande parte da sociedade, minha visão em relação às Raves e festivais era bem deturpada.
Permitir-me experienciar a música eletrônica foi um passo importante na minha concepção de mundo e na desconstrução do senso comum referente à cena da e-music . Foi na pista, com os pés no chão, que me encontrei pela primeira vez. Sei que pode parecer bobagem, mas no fundo, você sabe a que me refiro. A paixão foi instantânea. Pela primeira vez me senti parte de algo maior, uma sensação indescritível que nunca consegui nomear. Foi então que mergulhei de cabeça em uma viagem de conhecimento e passei a estudar a fundo o Trance e suas diversas facetas.
“Artista – Acsah Lírio. @artedelírio”
A curiosidade me permitiu entender que a mensagem vinculada nesse tipo de entretenimento era muito mais extensa e englobava uma série de assuntos que vão além das festas. Conhecer a variedade de vertentes, a história do Psytrance, a filosofia do P.L.U.R (Peace, Love, Unity, Respect), as simbologias por trás de imagens e músicas, o significado de contracultura, entre outros temas, abriu minha mente para enxergar um vasto campo de possibilidades e acreditar em uma realidade fundamentada em coletividade, espiritualidade e senso de união. Entregar-se de peito aberto àquilo que o Trance oferece é permitir-se analisar as ramificações que estão, direta ou indiretamente, conectadas à cena musical.
O Trance surge como uma expressão daqueles que procuravam viver uma realidade pautada no respeito e na coletividade, uma ferramenta para coexistir com as diferenças e com o meio externo. A melodia nasce da combinação de batidas sintetizadas associadas aos mantras budistas e hinduístas, agregando para si valores espirituais com o intuito de promover uma reflexão para além dos problemas sociais. A dança, como meditação ativa, abre margem para a conexão do sujeito consigo mesmo.
“Artista – Acsah Lírio. @artedelírio”
Nosso movimento bebe na fonte da contracultura, sendo que essa começou a dar os seus primeiros sinais na década de 1950 entre poetas e artistas norte-americanos (nomeados como Beat Generation ou Beatnick) com a produção de textos literários que contestavam a cultura vigente e criticavam, por exemplo, o incentivo indiscriminado ao consumo e os tabus sociais da época. Na década seguinte, o movimento Hippie teve papel importante no cenário cultural, alinhado com as pautas ambientais que ganhavam espaço no debate geopolítico, e, inseridos no contexto contracultural, a tribo levantava a bandeira “Paz e Amor” e se opunha à política bélica e de guerra.
Estamos em 2021, em meio a uma das maiores pandemias da história do homem. É complicado pensarmos em um mundo pós pandêmico sem levarmos em consideração a crise que também estamos vivendo enquanto humanidade. Diariamente, deparamo-nos, atônitos, com a falta de senso de coletividade e respeito com o próximo. O meio ambiente adoece: o desmatamento, as mudanças climáticas, poluição e outros fatores que colocam a humanidade à beira do abismo de uma possível crise irreversível.
“Artista – Acsah Lírio. @artedelírio”
O Psytrance abre portas para a possibilidade de promover uma verdadeira mudança sociocultural pautada no convívio harmônico com o meio ambiente, além de promover o fortalecimento de relações mais verdadeiras e humanas consigo mesmo e com o outro. Ampliar nossa visão e despertar a consciência de que tudo a nossa volta é uma extensão do que nós somos, nos obriga a questionar nossa própria conduta enquanto seres sociais. O que é ótimo.
“Artista – Acsah Lírio. @artedelírio”
Cabe a nós, apaixonados pelo Trance, manter nossa história viva, lembrando sempre de onde viemos e para onde queremos ir. Cuidemos de nosso espaço para que não continuem banalizando nossas celebrações com atitudes que vão de encontro aquilo que o nosso universo se propõe a ser. Os próximos conteúdos serão focados em aprofundar os temas citados no decorrer desse texto, com o objetivo de fomentar reflexões e debates que idealizem uma nova realidade através do Psytrance. Convido vocês a acompanharem as futuras publicações, e lembrem-se:
“O trance é a manifestação potente do universo quando ele está amando”.
Thiago Cerqueira
Yan Fernando
Meu irmão. Eu não paro de ler essa matéria. E hoje a lerei no instagram ao vivo. Add lá @tohanyskywalker.
Esse texto reflete muito do que venho discutindo e falando ultimamente aqui no Pará. Gratidão