As origens da música eletrônica

O primeiro movimento artístico que acendeu o pavio da música eletrônica foi o Dadaísmo, no começo do século XX. Idealizado por quatro anarquistas europeus, o movimento tinha como princípio fugir de quaisquer ideologias e doutrinas existentes na época, buscando assim a “essência do espírito”, a liberdade de expresso e uma forma de protesto contra a Primeira Guerra Mundial e a estática da sociedade burguesa.

11250928_745980012178951_2646245323325007655_n                                                          imagem: The Ayahuasca Community

Com o intuito de romper barreiras étnicas e sociais, os Dadaístas utilizavam diversas linguagens para expressar sua arte. Podemos encontrar publicações como The Blind Man, Rongwrong e New York Dada, esculturas que não representavam a imagem do homem nem nada mundano como a “Cyprian Sculpture” de Jean Arp e composições musicais “modernosas”, baseadas na utilização de sons abstratos, como no poema musical “Ursonate”, do alemão Kurt Schwitters, que era composto por gemidos e outros sons bem esquisitos.

Um dos fundadores do movimento Dadaísta, Jean Arp, e sua esposa Sophie Taeuber-Arp, resumiram o objetivo de sua arte da seguinte forma:

“Nós não queremos imitar a natureza, não queremos copiar, queremos criar. Nós queremos criar como as plantas criam frutos, não queremos copiar. Nós queremos criar de um modo imediato…”

“… chamamos isto de arte concreta”.

Russolo e sua “Arte dos Ruídos”

Provavelmente o maior inspirador para o Dadaísmo (e para a evolução da música eletrônica, diga-se de passagem) foi o pintor e compositor italiano Luigi Russolo, que desenvolveu uma série de instrumentos produtores de ruídos chamados “Noise Intoners” (Intonarumori).
Os Intonarumori eram ressoadores acústicos criados para gerar a imagem sonora descrita no livro “The Art of Noises” (A Arte dos Ruídos), de Russolo. O livro trata da evolução histórica desde o silêncio até o surgimento do ruído na vida do homem e, enfim, o uso dos ruídos na música.

O primeiro concerto realizado por Russolo foi em 1914. Pelo que dizem as más línguas, terminou com uma chuva de tomates atirados pela platéia.

As tentativas de Russolo de incorporar suas teorias Futuristas na música e na arte deram início às mais extraordinárias experimentações musicais, consequentemente aumentando a percepção musical do homem moderno para timbres e frequências que iam além da capacidade dos instrumentos musicais tradicionais.

“Nos primórdios a vida era totalmente silenciosa. No século 19, com a invenção das máquinas, o ruído surgiu. Hoje, o ruído triunfa e reina supremo sobre a sensibilidade do homem”.

– Luigi Russolo, 1913

Hoje em dia, suas previsões estão comprovadas em todos os tipos de composições, do Pop ao estilo de som mais underground, não estão?

De volta para o futuro: As primeiras gravações
Hoje em dia o Gravador é encontrado nos telefones celulares, na pasta Acessórios do Windows e será, para sempre, uma das ferramentas mais importantes no mundo da música, indiscutivelmente.

Quando Thomas Edison inventou o “Phonograph”, em 1877, não passava por sua cabeça até onde sua idéia poderia chegar. A intenção inicial era manter registros de contratos e tratados de negócios. “Gravações não mentem” dizia ele.

Acidentalmente, o que ele inventou – salve Edison – foi o mercado fonográfico!

Todos que apreciavam ou faziam música naquela época simplesmente adotaram o Fonógrafo como o brinquedo do momento. Músicos e compositores diminuíram suas obras para caberem no disco de 78rpm (rotações por minuto), os vocalistas mudaram seu estilo de canto para que suas vozes fossem registradas razoavelmente no gravador, as vendas de instrumentos caíram subitamente e cada vez menos os admiradores da boa música se reuniam em torno de um piano para curtir um som. Agora o negócio era ficar em casa, com o ouvido colado na corneta do Fonógrafo.

A engenhoca era um sistema mecânico composto por uma corneta, uma agulha presa a esta corneta, um cilindro de cera e uma manivela. Para fazer uma gravação, bastava girar a manivela em uma velocidade constante (78rpm) e falar para dentro da corneta. Assim, é medida que a corneta amplificava o som que estava chegando, a agulha vibrava, registrando no disco giratório uma representação “parecida” com a onda sonora original.

É claro que este sistema rudimentar apresentava pouca fidelidade com relação ao som original, porém, ao girar a manivela outra vez, era possível ouvir o que havia sido gravado, e isso já era incrível!

Ouça algumas gravações feitas no Fonógrafo:
 Primeira gravação, realizada por Édison em 1877.

Comentários de quem viveu esta época são que as pessoas não conseguiam distinguir a diferença entre uma gravação no Fonógrafo e uma performance ao vivo, tamanha a admiração pela nova tecnologia.

Eis que surge o gravador de fita

Até 1920, a tecnologia para gravações musicais não havia evoluído muito com relação à invenção de Édison no século anterior, mas em 1926 tudo mudou. A eletricidade finalmente chegou aos estúdios, trazendo consigo uma grande evolução no mercado fonográfico e mais um passo na história da música eletrônica.
Criado pelos alemães durante a Segunda Guerra Mundial, o gravador magnético, ou gravador de fita, era o que faltava para disparar o mercado fonográfico. Com essa invenção tornou-se possível criar registros sonoros muito mais fiéis ao som original, pois o sistema não dependia de um disco ranhurado por uma agulha, o registro era feito através da polarização de uma fita magnética de acordo com o sinal elétrico que entrava no gravador.

Ao mesmo tempo em que as gravações estavam melhorando e o mercado fonográfico crescia, alguns músicos e pesquisadores mais excêntricos encontraram um uso não tão “ortodoxo” para o gravador magnético.

E então a “Musique Concréte”
Em 1949, Pierre Schaeffer, francês, teve uma visão diferente sobre o advento da eletricidade no mundo da música. Maravilhado com os microfones e os gravadores de fita, Schaeffer juntou-se com Pierre Henry e formou o “Groupe de Recherche de Musique Concréte”, ou GRMC, onde elaborou uma série de experimentos com gravações.

Com as novas ferramentas, os Pierres passaram a realizar gravações de sons da natureza, ambientes, ruídos, e tudo que viesse em suas férteis imaginações. Eram os chamados “Objetos Sonoros” que dariam vida ao conceito da Musique Concréte.

A partir destes objetos sonoros os dois franceses buscavam formas de composição para o material, utilizando os gravadores de fita literalmente como instrumentos musicais. Faziam edições, montavam loops (repetições de um mesmo trecho) e maluquices que impressionantemente tinham ritmo e até melodia!!

As técnicas desenvolvidas incluíam tocar a fita de trás para frente, cortar e emendar pedaços de fitas, misturar vários sons para criar texturas e alterar a velocidade de reprodução dos gravadores.

Uma das técnicas que eu achei a mais incrível (ou mais maluca!!) durante esta pesquisa foi a de criar loops grandes, maiores do que o espaço físico do gravador, esticando a fita para fora do rolo e segurando com um lápis ou pedestal de microfone.

 

Este foi o passo mais marcante na evolução para o que conhecemos hoje como música eletrônica. As composições não eram arranjadas antes da gravação, não havia instrumentos musicais tradicionais e nem formas previamente conhecidas. Tudo começava a partir dos objetos sonoros, que eram então colocados nos gravadores e editados, repetidos e misturados para formar uma história musical completamente diferente de qualquer coisa que já havia sido feita antes.

Há confusões quanto à validade desses experimentos, como há com a Dance Music de hoje em dia, as pessoas não entendiam que o que Schaeffer estava fazendo na verdade era criar um novo meio de expressão através da música, utilizando elementos não tradicionais, assim como fazem os produtores de música eletrônica atuais. As técnicas modernas são muito parecidas com as que estes dois franceses inventaram em seu estúdio analógico, porém temos muito mais facilidade em realizí-las hoje graças aos equipamentos digitais.

Outros compositores que foram influenciados por Schaeffer, seguindo com seus experimentos, são: Edgard Varése, Karlheinz Stockhausen, Vladimir Ussachevsky, os Beatles, John Cage e todos nós, produtores de música eletrônica.

O instituto GRM de pesquisa continua vivo e triunfante, tendo desenvolvido umas das ferramentas digitais mais incríveis do mercado de produção atual, os softwares GRM Tools.

Quem quiser saber mais sobre os assuntos mencionados aqui, ou tiver alguma dúvida, fique a vontade para entrar em contato comigo em: sterman@2600hz.com.br

Um abraço!!

Eduardo Sterman – Professor e Diretor

2600Hz Criações Musicais

Música… Tecnologia… Abra seus ouvidos…

www.2600hz.com.br

Referências
Wikipedia: Musique Concréte / Electronic Music / Tape Recorder / Phonograph
Sonhors (http://sonhors.free.fr/)
UBU Web (http://www.ubu.com/)
National Public Radio (http://www.npr.org/)
Texto redigido por Eduardo Sterman. Todos os direitos reservados.

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